Nos últimos anos, as transformações nos padrões de conforto e saúde têm moldado de maneira significativa os requisitos construtivos e de manutenção associados aos edifícios de serviços. Consulte o artigo desenvolvido por Arlindo Louro, Diretor Comercial e Marketing do IEP, sobre conforto e ambiente saudável em edifícios de serviços.
Assistimos, nos últimos anos, a mudanças significativas nos conceitos e requisitos de conforto e de saúde, e, subsequentemente, nos requisitos construtivos e de manutenção, associados aos edifícios de serviços.
Num primeiro momento particularmente marcante, em Abril de 2006, com a publicação da legislação que obrigava à certificação energética e da qualidade do ar interior dos edifícios de serviços, regida pelo Regulamento dos Sistemas Energéticos de Climatização em Edifícios (RSECE) no âmbito do Sistema Nacional de Certificação Energética e da Qualidade do Ar Interior nos Edifícios.
Mais recentemente com a publicação em 2013 do Regulamento de Desempenho Energético dos Edifícios de Comércio e Serviços (RECS) no âmbito do Sistema de Certificação Energética dos Edifícios.
Veio a legislação desde o início reconhecer a importância do tema, as suas consequências ao nível das necessidades energéticas, mas também da necessidade de controlo sobre o desempenho e conformidade dos sistemas instalados, e das opções construtivas de cada projeto.
Olhando para o RSECE, podemos perceber que se tratava de uma legislação muito completa que procurava atingir o equilíbrio entre os índices relacionados com o desempenho energético e o nível da qualidade do ar interior, e que desde logo nos veio evidenciar que muito havia a fazer no plano quer das especialidades das engenharias envolvidas, quer da arquitetura.
Aplicada a novos edifícios e alargada a sua aplicação a edifícios existentes, rapidamente se verificou que as práticas construtivas e de manutenção comprometiam a emissão do certificado definitivo em especial por questões relacionadas o incumprimento em matéria de qualidade do ar interior.
Processos arrastados, investimentos de correção com valor significativo e incompreensão ou mesmo falta de sensibilidade para este tema levaram a que o modelo fosse reformulado, não por aperfeiçoamento, mas pela sua desarticulação, e, portanto, em aparente retrocesso porventura explicável na cedência a novas orientações que não as da causa fundadora dessa mesma certificação.
Com a entrada em vigor do RECS em 2013, a certificação dos espaços de serviços culmina com a emissão do certificado energético.
Segundo o DL 118/2013 “São eliminadas as auditorias de qualidade do ar interior, mantendo-se, contudo, a necessidade de se proceder ao controlo das fontes de poluição e à adoção de medidas preventivas, tanto ao nível da conceção dos edifícios, como do seu funcionamento, de forma a cumprir os requisitos legais para a redução de possíveis riscos para a saúde pública”.
Sendo certo que não foi abandonada pela legislação, a necessidade de cumprir com requisitos em matéria de qualidade do ar interior mantem-se, e até mesmo esta passa a ver, de forma explícita, a sua gestão relacionada com a ação preventiva em matéria de saúde pública.
Mas, por outro lado, foi deixado ao mercado toda a liberdade para definir como e quando monitorizar, num processo liberativo com uma metodologia de controlo pelo Estado Português que, que se percecione, nunca foi posta em prática.
Estamos perante um caso de liberalização, com ausência de controlo, num tema em que há desconhecimento e insensibilidade dos utilizadores dos espaços, e onde, em resultado da necessidade de controlo de custos, existe uma natural pressão sobre quem gere e mantem as infraestruturas de serviços públicas e privadas.
Com exceção de situações que possam gerar reclamações, por serem óbvias e facilmente detetáveis pelos meios sensoriais de quem circula ou trabalha nesses espaços, ou mesmo de casos de problemas de saúde que possam gerar recurso a meios hospitalares em dimensão que levante suspeita, nada mais será relacionável com a conformidade dos espaços de serviços com a legislação em vigor.
O processo evolutivo que se iniciou em 2006, e que aportou ganhos de competência e de inovação e desenvolvimento a quem projeta, a quem instala e a quem assegura a manutenção, não pode retroceder.
Cabe a quem tem responsabilidades de implementação da legislação, fazê-lo, compreendendo a sua relevância.
Cabe ao Estado Português garantir que o acervo legislativo se aplica, tanto mais que, repito, este mesmo Estado assume, e publica, que a boa gestão da qualidade do ar interior é uma questão de saúde pública.
Assim se espera.